sexta-feira, março 21, 2008

MUITO ALÉM DO TEXTO

Mesmo sem eu acreditar que seria possível montar a peça "Violência" juntamente com as demais "Teens" e "Boys and Girls" num mesmo projeto, o Fausto me convenceu de que seria possível porque com esse texto nós teríamos a possibilidade de mostrar uma terceira faceta da juventude, qual seja: aquela dos jovens que têm dinheiro mas isso não representa nada... nem a vida.
A escolha de elenco foi o primeiro acerto para que a peça se concretizasse.
Sabrina Caires, Robson Vellado e Rodolfo Aiello.
A direção resolveu que o espetáculo seria encenado somente à meia-noite. Não posso imaginar melhor escolha. O clima da madrugada ajudava o público a adentrar na trágica história daquele trio.
Cena a cena a direção me surpreendia:
A maneira de o Fausto encenar o espetáculo fazia com que eu imaginasse que estava assistindo a um filme. A tensão se desenvolvia numa crescente e a sensação de que não haveria outra possibilidade de redenção para aqueles personagens era angustiante. A beleza da iluminação, em contraste com a simplicidade do cenário, reforçava a idéia de que podia estar assistindo a um filme.Mesmo depois de ter concluída a temporada com a "Trilogia Jovem" e os depois espetáculos terem seguido carreira a parte, "Violência" continuou em cartaz no Cine Teatro Biju às sextas-feiras, à meia-noite.

VIOLÊNCIA

Escrevi "Violência" no final de 1999. Depois de um ano extremamente complicado resolvi escrever algo que pudesse me deixar chocado. Na verdade não sei muito bem se queria fazer uma provocação a mim mesmo ou um desafio. Desde que comecei a escrever sempre fui movido por desafios e, tentar passar para o papel o que um imaginava ser "Violência" representava um desafio.
Logo que comecei a escrever a peça percebi que não se parecia muito bem com as demais que havia escrito. Os personagens jovens ainda continuavam em cena, mas a amargura e o desinteresse pela vida tinham aumentado.
Escrevi a primeira cena como se fosse para filmá-la.
CENA 1 – O BANHEIRO


UM RAPAZ ENTRA NUM BANHEIRO COLETIVO DE UMA PRAÇA, VAI ABRINDO A BRAGUILHA DE SUA CALÇA E DIRIGINDO-SE A UMA DAS PORTAS QUE ESTÁ ENTREABERTA. QUANDO APOIA SUA MÃO SOBRE A PORTA E A ABRE, LEVA UM SUSTO AO VER UMA GAROTA DE APROXIMADAMENTE 17 ANOS SENTADA AO LADO DA BACIA SANITÁRIA E COM A CABEÇA ABAIXADA ENTRE AS PERNAS. ELE PÁRA IMEDIATAMENTE DE ABRIR O ZÍPER DE SUA CALÇA E FAZ MENÇÃO DE VOLTAR...

RAPAZ - Desculpa, eu não sabia que tinha alguém aqui. (passa a fechar a porta lentamente)
CAMILA - (olhando para ele) Entra.
RAPAZ - (pára de fechar a porta)(sem jeito) Realmente eu não queria incomodá-la, não prestei atenção ao entrar aqui. Nunca eu invadiria o banheiro das mulheres.
CAMILA - Esse não é o banheiro das mulheres.
RAPAZ - (espantado) Não?
CAMILA - Não.
RAPAZ - (ainda mais constrangido) Será que eu teria que me dirigir a ele pra fazer xixi?!
CAMILA - (tirando o braço do vaso sanitário) Pode usar aqui.
RAPAZ - (sem jeito) Aqui?!
CAMILA - Eu invadi seu espaço, nada mais justo que você possa fazer o que tinha planejado, no lugar onde pretendia.
RAPAZ - Não sei...
CAMILA - Não se incomode comigo.
RAPAZ - É que...
CAMILA - Se você quiser eu fecho os olhos ou abaixo a cabeça.
RAPAZ - O problema é que espirra.
CAMILA - (sem dar importância) Vai fundo; só não vira o esguicho pra cá.

O RAPAZ SENTE UMA EXCITAÇÃO MUITO GRANDE E VAI SE APROXIMANDO DO VASO SANITÁRIO AO MESMO TEMPO QUE ABRE A BRAGUILHA DE SUA CALÇA. CAMILA, SEM DAR IMPORTÂNCIA AO ACONTECIMENTO, SIMPLESMENTE ABAIXA A CABEÇA DA MESMA MANEIRA QUE ESTAVA NO INÍCIO...
O RAPAZ, QUE ESTÁ DE COSTAS PARA A PLATÉIA, TIRA SEU PÊNIS PARA FORA E PASSA A FAZER XIXI, AINDA SENTE-SE MEIO CONSTRANGIDO MAS O DESAFIO O FAZ URINAR LENTAMENTE...
CAMILA, SEM DIZER NADA OU ESBOÇAR QUALQUER RECLAMAÇÃO COM RELAÇÃO ÀS GOTAS QUE ESPIRRAM, LEVANTA A CABEÇA LENTAMENTE E, NUM ÚNICO MOVIMENTO, PASSA SEU OLHAR PELO XIXI DENTRO DO VASO E EM SEGUIDA VAI SUBINDO PELO CORPO DELE ATÉ CHEGAR AOS SEUS OLHOS.
ELE FICA TÃO MAGNETIZADO COM O OLHAR DELA QUE MESMO TERMINANDO DE FAZER XIXI PERMANECE NA MESMA POSIÇÃO.

CAMILA - (indecifrável) Terminou.
RAPAZ - (totalmente envolvido) É?
CAMILA - Não estou ouvindo mais o barulho do seu xixi na água.
RAPAZ - É?
CAMILA - Você deveria fazer alguma coisa.
RAPAZ - E se eu lhe disser que não sei o quê.
CAMILA - Eu diria que um rapaz de 18 anos já deveria saber guardar seu pinto após o uso.
RAPAZ - Como você sabe que eu tenho 18 anos?!
CAMILA - 17 ou 19... que diferença faz!
RAPAZ - 18.
CAMILA - Já pode fazer o que quer da vida. (vai levantando-se e ficando a poucos centímetros do rosto dele, numa distância que possa sentir a excitação dele e ouvir sua respiração descompassada)
RAPAZ - Já.
CAMILA - E faz?!
RAPAZ - (incomodado com a proximidade dela) Nem sempre.
CAMILA - E quando não?
RAPAZ - Quase sempre.
CAMILA - Pois deveria mudar isso. (anda com seu rosto pelo dele e sutilmente toca seus lábios no dele)
RAPAZ - E se eu lhe disser que não sei como?!
CAMILA - Eu posso dizer que não acredito em você.
RAPAZ - E se eu não lhe disser nada?!
CAMILA - Eu desconfiarei de você.
RAPAZ - E daí?
CAMILA - Daí eu serei obrigada a te testar.
RAPAZ - (pela primeira vez move sua cabeça – lentamente – para tentar beijá-la) Teste?!
CAMILA - Um teste.
RAPAZ - Eu nunca fui bom em testes.
CAMILA - Eu nunca fui boa em testar.
RAPAZ - E eu faço...
CAMILA - ...guarda seu pinto.
RAPAZ - Não sei.
CAMILA - (pega o pinto dele – sem olhar para baixo, mas com total domínio – e, com muita naturalidade, o põe para dentro da calça) (após guardá-lo) Eu não entregaria o zíper de minha calça a um estranho.
RAPAZ - É um conselho ou uma ameaça?!
CAMILA - Uma preocupação com objetos preciosos; eu não me perdoaria se perdesse uma pedra bruta... com o tempo e uma boa lapidação ela se tornaria um diamante!
RAPAZ - E quem você me aconselharia a levá-la para ser lapidada?!
CAMILA - Eu nunca entrego informações de graça.
RAPAZ - Eu pago. (tenta beijá-la com um movimento rápido da cabeça mas ela tira seu rosto)
CAMILA - Eu tenho certeza que você paga.

CAMILA O ABRAÇA VIOLENTAMENTE, NUM MOVIMENTO TÃO RÁPIDO QUE ELE DEMORA ALGUNS SEGUNDOS PARA PERCEBER QUE ESTÁ SENDO BEIJADO. QUANDO PERCEBE, PELA PRIMEIRA VEZ CONSEGUE FAZER MOVIMENTOS COM SEUS BRAÇOS E A ABRAÇA, MAS NÃO A ACARICIA, APENAS A SEGURA COM FORÇA, COMO SE NÃO QUISESSE PERDER ESSE MOMENTO NUNCA MAIS NA VIDA. O BEIJO DELA É TÃO VORAZ QUE O DEIXA TOTALMENTE DOMINADO. ELA COMEÇA A PASSAR SUAS MÃOS PELAS COSTAS DELE E EM SEGUIDA POR SUA BUNDA, O SEGURA COM UMA FORÇA QUE PARECE QUE QUER ENTRAR DENTRO DELE. ELE ESTÁ QUASE EXPLODINDO DE EXCITAÇÃO E PASSA A DESCER SUA MÃO EM DIREÇÃO A BUNDA DELA.
QUANDO ELE SEGURA COM AS DUAS MÃOS NA BUNDA DELA, CAMILA PÁRA DE ABRAÇÁ-LO E COM SUAS DUAS MÃOS, SEGURA O ROSTO DELE E LHE DÁ UM BEIJO QUE PODERIA SUGAR SUA VIDA, EM SEGUIDA PÁRA E AFASTA SEU CORPO DO DELE UNS 30 CENTÍMETROS.

RAPAZ - (totalmente excitado e sem entender a reação dela) (quase sem fôlego) O que foi?!!!
CAMILA - (fria) Espera.
RAPAZ - Eu não te entendo.
CAMILA - Não tenta.

ELE PERMANECE ESTÁTICO, OLHANDO PARA ELA QUE VIRA-SE E LENTAMENTE VAI SE ABAIXANDO PARA PEGAR ALGO QUE ESTÁ ESCONDIDO ATRÁS DO VASO SANITÁRIO...
ENQUANTO ELA VAI SE ABAIXANDO ENCOSTA SUA BUNDA NO PINTO DELE E O FAZ PERDER O FÔLEGO, ELA NÃO DEVE FAZER ESSE MOVIMENTO INTENCIONALMENTE, MAS APENAS COMO UMA CASUALIDADE, NECESSIDADE DEVIDO TER QUE ABAIXAR-SE...

RAPAZ - (em êxtase) Você me mata!
CAMILA - (fria) Lamento!

CAMILA PEGA UM REVÓLVER ATRÁS DO VASO SANITÁRIO E AO MESMO TEMPO QUE PRONUNCIA ESSAS ÚLTIMAS PALAVRAS VIRA-SE E SEM ESPERAR QUE ELE VEJA A ARMA, ATIRA NELE. É UMA ARMA MUITO PODEROSA E FAZ UM BARULHO ENSURDECEDOR AO SER DISPARADA – DEVIDO TAMBÉM AO ECO DO BANHEIRO – E O JOGA NO CHÃO.
AO CAIR NO CHÃO ELE TEM SEU PEITO ESTOURADO E COMPLETAMENTE SUJO DE SANGUE...
ELA APROXIMA-SE DELE COM MUITA NATURALIDADE O OLHA E PARTE EM SEGUIDA SEM DIZER UMA PALAVRA...

E assim que a vi em cena, dirigida magistralmente pelo Fausto, percebi que ele tinha entendido os anseios das minhas personagens.
A cena inicial parecia ter saído diretamente da minha mente para o palco... mas estava melhorada... envolta numa dramaticidade que não consegui explicar.

segunda-feira, março 10, 2008

BOYS AND GIRLS

Depois de ter escrito TEENS achei que deveria apresentar a visão masculina da adolescência também. Na verdade, escrever BOYS AND GIRLS foi muito mais fácil que TEENS porque puder lembrar de muitas histórias minhas e de meus amigos.
Também, em BOYS AND GIRLS a proposta era fazer um texto ainda mais leve que TEENS. O resultado final foi além do esperado. Com personagens que circulam por qualquer escola, clube, boate, etc, o público logo percebeu que poderia se divertir muito com a história dos seis personagens principais da peça.
Mas BOYS AND GIRLS não era somente uma comédia. Seguia a mesma linha dramatúrgica de TEENS, assim, fazia com que o espectador assistisse ao espetáculo e, ao mesmo tempo, refletisse cobre as questões propostas. Sem preocupações morais... senão nunca alcançaria o interesse dos adolescentes.
Novamente, o Fausto, com sua direção precisa, conseguiu criar um ritmo alucinante entre as cenas e fez com que o espetáculo se tornasse muito mais dinâmico. Traições, lamentações, uso de drogas, paixões não correspondidas... Tudo está em BOYS AND GIRLS... além de uma trilha sonora e linguagem visual que marcaram o espetáculo.
Juntamente com TEENS, BOYS AND GIRLS seguiu temporada no testro Biju, em São Paulo, e depois, em teatro municipal até o final do ano.
Outra sacada do espetáculo foi a programação visual criada pelo designer Rodrigo Malagoli. O cartaz já era o próprio chamariz para a garotada e serviu como uma luva!
Essa parceria não se esgota nunca!

domingo, março 09, 2008

TEENS - SEGUNDA VERSÃO

A primeira versão de TEENS havia sido bastante satisfatória, principalmente devido à presença de duas atrizes que praticamente levaram o espetáculo, falo de Cristina Guimarães - que interpretou todas as personagens femininas adultas - e Fernanda Regia - que, magistralmente, interpretou a personagem Janaína.
Então, quando fui convidado pelo Fausto para assistir aos primeiros ensaios de TEENS disse que não gostaria de fazê-lo. Na verdade achei que não caberia a mim fazer considerações sobre a montagem. Sempre penso que o diretor tem de ter a sua liberdade para trabalhar nos textos.
Assim, não cheguei a assistir nenhum dos ensaios, mas mantive contato com o Fausto durante todo o período de ensaios e discutimos muito sobre as transformações que as personagens sofriam no transcorrer do espetáculo.
Disse também que "TEENS" havia sido um grande desafio para mim porque mostrava as transformações que as meninas sofrem no período da adolescência. De fato, eu estava do outro lado da história quando isso acontecia então precisei fazer uma pesquisa bastante profunda sobre o tema. Muitas entrevistas, convivência com adolescentes em escolas, leitura de revistas "Querida", "Capricho", etc.
Mas quando "TEEN" estreou tive uma grata surpresa porque parecia que o Fausto tinha entendido até as entrelinhas do texto... e enriquecido em todas as possibilidades.
Diferentemente da primeira montagem, essa contava com muito mais atores e isso proporcionou um dinamismo ainda maior às cenas.
Se pensei que "TEENS" havia tido uma montagem muito boa anteriormente, o Fausto me mostrou que a mão de um diretor pode fazer toda a diferença...
As três atrizes que interpretaram as personagens principais (Evelyn Cacau, Juliana Cavalcanti e Carla Borges) conseguiram me surpreender a cada momento com suas sensibilidade e dedicação aos seus papéis.
Um grata lembrança que, após a temporada no Cine Teatro Biju, prosseguiu até o final do ano de 2002 em teatro da prefeitura de São Paulo. Sempre com um público muito bom que se identificava plenamente com a história de Janaína, Laurinha e Flávia.

TRILOGIA JOVEM

Em meados de 2000, quando estava sem nenhum projeto específico para trabalhar, recebi uma carta de uma pessoa que não via há muito tempo. Na verdade eu o conheci nas reuniões da FEPAMA, tínhamos desenvolvido um projeto juntos mas, como não prosperou, nunca mais voltamos a nos falar. A carta que recebi dele estava endereçada ao "Autor Renatho Costa".
Na verdade, estou falando de um amigo que já nos deixou há alguns anos, mas que nessa carta pedia para se encontrar comigo para retornarmos ao projeto anterior. Estou falando do diretor Fausto Silvester.
Em nosso primeiro encontro o Fausto pediu para que eu retrabalhasse no antigo texto "Contrato Fatal". Dessa vez ele montaria uma "Trilogia dos Relacionamentos". Ele queria que eu fortalecesse alguns dos "ingredientes" do texto: Sensualidade, tensão (suspense), ação (contato físico) e uma dose de humor.
Fiquei em dúvida se seria possível fazer algo dessa maneira, porém, acabei aceitando o desafio e voltei a trabalhar no texto. Depois de muitos tratamentos cheguei a versão final de "Contrato Fatal". O Fausto começou a captação de recursos e, em uma dessas conversas eu lhe falei de outros espetáculos que eu havia escrito para um público específico, ou seja, para adolescentes.
Ficamos conversando por várias horas sobre "TEENS", "BOYS AND GIRLS" e "VIOLÊNCIA". O Fausto ficou encantado com a possibilidade de desenvolver um projeto que trabalhasse com os três ao mesmo tempo... Dias depois eu lhe enviei as cópias dos três textos e, logo em seguida ele me ligo dizendo que pretendia montar os três ao mesmo tempo como uma "Triologia Jovem".
Em 2002 estrearam os três ao mesmo tempo no Cine-teatro Biju, em São Paulo.