
Tinha muito receio de que o público não aceitasse bem a proposta da encenação, mas mesmo assim, com os atores acreditando no projeto, encenamos a história de dois narradores que são convocados para esclarecer as circunstâncias que ocorreram a morte dos irmãos, Irma e Kravo Karamishovisk.
Nos primeiros instantes da encenação, logo após a entrada dos dois narradores, os demais integrantes do elenco cumprimentavam-se mutuamente e davam seus pêsames. O estranhamento do público aumentou, mas assim que os narradores começaram a discutir os fatos obscuros que pautaram a morte dos irmãos – sempre utilizando um português requintado e culto, além de uma polidez quase insuportável na forma com que se tratavam –, houve o convencimento do público e as gargalhadas surgiram.
ORADOR 1 - Tudo é muito estranho, não?!
ORADOR 2 - Estranho seria se estranhássemos toda essa estranheza!
ORADOR 1 - Realmente seria.
ORADOR 2 - Pois se fomos confiados a falar, que falemos.
ORADOR 1 - Não há muito que dizer.
ORADOR 2 - Mas também não há pouco.
ORADOR 1 - Digamos que há, médio.
ORADOR 2 - Médio é uma boa quantia.
ORADOR 1 - Então, por favor, deixemos claro aos espectadores que quando chegarmos a essa quantia, que eles nos interrompam.
ORADOR 2 - Muito bem observado; porque muitas vezes no calor de uma discussão podemos perder as medidas.
ORADOR 1 - Sem mais delongas, conversemos.
ORADOR 2 - Eu gostaria de deixar bem claro que sei tudo sobre a fatídica morte dos irmãos Karamishovisk.
ORADOR 1 - Fico muito envaidecido de saber, mas infelizmente tenho a dizer que ninguém sabe mais que eu.
ORADOR 2 - (com certa irritação) Pois veremos.
ORADOR 1 - Veremos mesmo.
ORADOR 2 - Eles se encontraram pela última vez na sala de estar da mansão. (olha para o meio do palco)
Rir do absurdo daquela situação foi um convite muito bem aceito pelo público... e minha felicidade por ter podido retornar à linguagem que sempre gostei, o “teatro do absurdo”... A mini-peça teve uma carreira curta, mas foi montada novamente anos mais tarde (2005), sob a direção de Sabrina Caíres.
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